Fernanda Abreu revê o álbum e o show ‘Da lata’, após 30 anos, em documentário em cartaz no Festival do Rio até este sábado, 6 de outubro
Reprodução / Documentário ‘Da lata 30 anos’
♫ OPINIÃO SOBRE DOCUMENTÁRIO MUSICAL
Título: Da lata 30 anos – O documentário
Direção: Paulo Severo
Roteiro: Paulo Severo e Fernanda Abreu
Cotação: ★ ★ ★ ★ ★
♬ Fernanda Abreu reitera o apuro que pauta a trajetória da artista carioca ao fazer a abreugrafia do álbum Da lata em documentário em cartaz até hoje sábado, 6 de outubro, na mostra Retratos da Première Brasil da 27ª edição do Festival do Rio. Assinado por Fernanda com o diretor Paulo Severo, o roteiro do filme mantém o pulso firme ao longo dos 95 minutos de projeção. Inexistem gorduras nesse roteiro iniciado com breve retrospecto da carreira de Fernanda até o álbum de 1995.
A direção e a edição de Severo contribuem decisivamente para que Da lata 30 anos – O documentário chegue à tela com fluência exemplar, com unidade visual e com um paleta de assuntos relevantes que legitimam a existência do filme produzido pela empresa Garota Sangue Bom com a colaboração da TV Zero.
Disco que expandiu em 1995 a carreira solo iniciada pela artista em 1990, oito anos após Fernanda Abreu ter sido projetada em escala nacional em 1982 como vocalista da banda Blitz, Da lata atravessou os últimos 30 anos como o álbum mais relevante da discografia da cantora e compositora.
A mistura antenada de samba com o então emergente funk carioca azeitou o pop de pista feito por Fernanda neste disco construído com o batuque samba-funk e com toques de R&B e rock, além das letras que aguçaram a visão social de uma cidade, o Rio de Janeiro (RJ), que já tendia a se partir pelas tensões sociais cotidianas ao mesmo em que pulsava unida no morro e no asfalto com um som quente, calcado pelo batidão do funk que começava a sair do circuito periférico dos bailes da pesada para ganhar o Brasil.
Como Fernanda conclui ao fim da narrativa, Da lata foi o disco que cunhou o epíteto Garota carioca suingue sangue bom na identidade sonora dessa artista que sempre primou pelo requinte visual de cada álbum ou show.
Com fotografia de Renato Carlos e trilha sonora de Tuto Ferraz, o documentário Da lata 30 anos segue nessa linha de sofisticação visual. Tanto que o artista visual Luiz Stein – responsável pelas capas bafônicas dos discos de Fernanda – criou cenografia inspirado na lata (matéria-prima da estética visual do disco) para o estúdio carioca Pancadão, onde foram captados os depoimentos da maior parte dos entrevistados. O que conferiu unidade estética ao filme.
E por falar em depoimentos, todo mundo fala, desde o fotógrafo da capa do disco (Walter Carvalho) até a figurinista do show Da lata (Cláudia Koepe) e a coreógrafa dos clipes e do show (Debora Colker)! Essa profusão de depoimentos enriquece o roteiro. Até porque os depoimentos fogem da babação de ovo pura e simples em cima da artista.
Os depoimentos são naturalmente positivos, mas muitos deixam evidentes, por exemplo, as tensões entre os dois produtores do disco, Liminha e Will Mowat (do grupo britânico Soul II Soul), e também as arestas financeiras aparadas pela artista com a gravadora EMI Music (representada no roteiro pela fala do então diretor artístico João Augusto) diante da feitura de um álbum de orçamento grandioso e produção intercontinental (parte das faixas produzidas por Mowat foi formatada em Londres). Sem falar no equilíbrio delicado conseguido por Fernanda para se movimentar (e se impor) no estúdio, como dona do disco, em universo fonográfico dominado por homens.
O documentário é valorizado pela abundância de imagens inéditas da gravação do álbum. Tudo o que é falado é corroborado pelas imagens, o que impede o roteiro de resultar em amontoado de depoimentos vazios (erro que torna cansativo muitos filmes do gênero).
O filme reabre a porta do estúdio Nas Nuvens para o espectador ver Fernanda Abreu em ação com colegas como Herbert Vianna, Lenine e Memê, DJ e produtor arregimentado para ajudar dar forma à música Babilônia rock. “Esse disco tem o molho brasileiro que define a Fernanda como uma artista de pista no Brasil”, sintetiza o DJ Memê.
Com o som quente do álbum Da lata, o pop dançante da artista extrapolou as fronteiras nacionais. O diretor Paulo Severo também documenta bem a exposição do álbum Da lata fora do Brasil, sobretudo na França, país em que Fernanda foi rotulada, em manchete de jornal, como “a Madonna das favelas”.
Além de dissecar o disco, faixa por faixa, o documentário reaviva a criação do show Da lata, fundamental para propagar o som envenenado de álbum emblemático que delineou a identidade musical de Fernanda Abreu, artista desde então e para sempre associada ao calor musical do Rio 40 graus.
Cartaz do documentário ‘Da lata 30 anos’, de Paulo Severo
Divulgação / Festival do Rio
Fernanda faz ‘abreugrafia’ do álbum ‘Da lata’ em documentário com o apuro que qualifica a obra solo da ‘garota carioca’
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