Hangar da Voepass em Ribeirão Preto (SP).
Sergio Oliveira/EPTV
Em sua pior crise financeira e impedido de operar voos pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o Grupo Voepass acaba de conseguir mais 180 dias da Justiça para não ser cobrado por credores enquanto tenta viabilizar seu plano de recuperação judicial.
Além disso, realizou mudanças em seu controle societário para ter mais recursos para pagar dívidas. Em agosto, segundo documentos obtidos pelo g1, as ações da empresas da companhia de Ribeirão Preto (SP) passaram a ser 100% controladas pela MAP Transportes Aéreos (entenda mais abaixo) e não mais pela Passaredo Transportes Aéreos (Voepass), que teve o Certificado de Operador Aéreo (COA) cassado pela Anac.
Com a inversão das empresas subsidiárias, o objetivo é tentar viabilizar a negociação de 92 slots – cotas de pouso e decolagens em aeroportos do Brasil ainda pertencentes à companhia – avaliados em mais de R$ 182 milhões e, com isso, garantir o pagamento de dívidas.
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“A conclusão exitosa dessa recuperação judicial depende da possibilidade de as recuperandas conseguirem transacionar o direito de exploração desse ativo com terceiros”, argumenta a empresa, em uma petição encaminhada à Justiça.
A mudança no comando foi um dos argumentos usados pela companhia em uma petição de tutela de urgência apresentado no início de setembro para tentar evitar que a Anac redistribua os slots remanescentes da Voepass. O pedido ainda não foi avaliado pela Justiça.
A expectativa é de que a assembleia de credores para definir o plano de recuperação judicial ocorra em outubro, segundo apuração do g1.
A reportagem questionou a Anac sobre a disponibilidade desses slots, mas não obteve um posicionamento. A reportagem também entrou em contato com a assessoria de comunicação da Voepass, mas não obteve uma resposta até a publicação desta notícia.
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Crise financeira e recuperação judicial
Já chamada de Passaredo, a Voepass atendia 16 destinos e já foi considerada uma das maiores do país, mas desde março foi proibida de operar, depois que a Anac identificou falhas de segurança e determinou providências, sobretudo após um desastre que matou 62 pessoas em agosto de 2024 em Vinhedo (SP).
Mais tarde, a agência cassou em definitivo o certificado de operador aéreo (COA) após apontar irregularidades não solucionadas pela companhia, além de determinar a redistribuição das cotas de pousos e decolagens, os chamados slots, para utilização de outras companhias no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo.
Essas restrições já vinham agravando a crise financeira da companhia, que ajuizou um pedido de recuperação judicial em abril. Na época, as dívidas estavam calculadas em mais de R$ 400 milhões, sem contar débitos em dólares, e, desse total, R$ 215 milhões tinham sido abrangidos pelo plano.
Em maio, o grupo conseguiu um parecer favorável para parte das empresas do grupo. A Passaredo Transportes Aéreos e a MAP Transportes Aéreos não tinham sido contempladas sob o argumento de que não havia atividade a ser recuperada, já que todos os voos estavam parados.
Em decisão posterior, de junho, a Justiça incluiu a MAP no plano de recuperação sob a justificativa de que a empresa comprovou ter serviços de hangaragem.
Com a exclusão da Passaredo Transportes Aéreos, o valor atualmente abrangido pela recuperação judicial é de R$ 25 milhões, embora o passivo das três empresas em recuperação – MAP, Passaredo Gestão Aeronáutica e Joluca Participações – seja superior a R$ 193 milhões.
Apesar dessas decisões, o grupo ainda tenta, por meio de outros recursos não analisados, incluir a Passaredo Transportes Aéreos na RJ.
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Ana Clara Marinho/TV Globo
A suspensão no pagamento de dívidas
Desde o início deste ano, a Voepass, por meio de diversos recursos, tem conseguido manter suspensas as cobranças de seus credores.
Em um primeiro momento, ainda quando ajuizou uma tutela cautelar antecedente, em fevereiro, obteve o prazo inicial de 60 dias. Em maio, depois que formalizou o pedido de recuperação judicial, conseguiu mais 120 dias, que venceram na última sexta-feira (26).
Na mesma data, após um novo pedido dos advogados, a companhia conseguiu mais 180 dias – seis meses – de suspensão de cobranças. Na decisão, a Justiça considerou que a demora processual – a assembleia de credores ainda não foi realizada – não foi causada por um descuido ou negligência das empresas do grupo em recuperação.
A mudança no comando e a negociação dos slots
Em uma petição apresentada em setembro, os advogados do grupo informaram uma mudança ocorrida em agosto no controle societário da Voepass, de modo que a MAP Transportes Aéreos – adquirida pelo grupo em 2019 – passou a ser a controladora das demais empresas e não mais a Passaredo Transportes Aéreos.
Na mesma proposta, o grupo sugere que, com essa reconfiguração, a companhia não teria impedimentos para negociar os slots com companhias aéreas, caso seja aprovado um aditamento no plano de recuperação para a criação de uma unidade produtiva isolada (UPI), que contaria principalmente com 92 slots da temporada de inverno, ou seja, válidos entre outubro deste ano e março de 2026.
🔎Uma UPI é um conjunto de bens de uma empresa em recuperação ou falência que podem ser negociados de forma independente, sem estarem atrelados a outras operações de um grupo empresarial que estejam com pendências e passivos.
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Nessa UPI, em outras palavras, o interessado na negociação conseguiria adquirir ativos como os slots, sem precisar assumir outros débitos da empresa. Na petição, os advogados citam que já existem interessados na obtenção desses slots, que poderiam ser arrendados.
Para isso, no entanto, eles solicitaram à Justiça que impeça a Anac de remanejar essas cotas, já que os slots da temporada de verão já foram redistribuídos.
As cotas ainda disponíveis, avaliadas em R$ 182 milhões, seriam suficientes não só para o pagamento de credores como também para a manutenção das atividades das três empresas em processo de recuperação, segundo os advogados.
“As requerentes não podem aguardar, por tempo incerto, o julgamento dos recursos mencionados acima pelo e. TJSP. (…) O direito de exploração dos slots remanescentes de titularidade da Passaredo representa o principal ativo detido pelo Grupo Voepass, o qual foi avaliado em R$ 182 milhões, de modo que a conclusão exitosa dessa recuperação judicial depende da possibilidade de as recuperandas conseguirem transacionar o direito de exploração desse ativo com terceiros. Simples assim.”
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